Texto por: Pedro Patrus - Vereador na Câmara Belo Horizonte
A reivindicação em torno de políticas públicas que garantam renda básica para a população é antiga. A ideia de que o Estado deve garantir uma quantia mínima para seus cidadãos usufruírem de algum nível de qualidade de vida, remonta ao século XVI, no início da Modernidade. Desde então, acadêmicos, cientistas sociais, administradores públicos e políticos enxergam cada vez menos essa ideia como uma utopia.
Talvez, a ideia de uma renda básica seja um caminho possível para enfrentar as transformações do mundo do trabalho que ampliaram o nível de instabilidade e segurança ocupacional para um número crescente de pessoas em todo o mundo. Os fenômenos da “uberização” e da “pejotização” são exemplos dessa instabilidade e precarização laboral. Dentre as características da “uberização” do trabalho estão a informalidade, vínculos precários com empresas de aplicativos que não asseguram mínimos direitos trabalhistas, como assistência médica em casos de acidentes no trabalho.
A “pejotização” cresceu enormemente no Brasil nos últimos 10 anos. Podemos caracterizá-lo como a transformação de trabalhadores em pequenas empresas prestadoras de serviços para grandes empresas. Na prática, a segurança e assistência dos empregos formais estão sendo trocados pela ilusão de certo tipo de empreendedorismo nocivo. A crise econômica que se abateu sobre o país a partir do golpe jurídico-midiático-parlamentar contra a Presidenta Dilma em 2016, foi agravada pela eclosão da pandemia da Covid-19.
Sabemos que a pandemia representou e ainda representa um enorme desafio em todo o mundo. Mas a ação criminosa, negacionista e obscurantista do Governo Bolsonaro contra a ciência, além da ausência de políticas públicas para garantir vacina, renda e comida para milhões de brasileiros tornaram o quadro ainda mais dramático em todo o país. Voltamos para o mapa da fome segundo a FAO/ONU; 6 em cada 10 brasileiros convivem diariamente com algum tipo de insegurança alimentar, segundo pesquisa OXFAM UFMG/UNB e Universidade Livre de Berlim (2021). Não bastasse todo esse drama, o desalento toma conta da juventude em nosso país: segundo o Atlas da Juventude da FGV Social (2021), 47% dos jovens de 15 a 29 anos se pudessem, deixariam o Brasil, agravado pelo desemprego que nesta faixa etária alcança a marca de 56%.
Até bem pouco tempo atrás éramos exemplo mundial na formulação e implementação de políticas de transferência de renda, com as experiências muito exitosas do Programa Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continua BPC. Nas últimas duas décadas, diversos estudos, pesquisas e indicadores sociais e econômicos demonstram a importância e os impactos extremamente positivos em termos econômicos, sociais e sanitários que o investimento feito através das políticas de transferência de renda tiveram no aumento do PIB, na expansão do mercado interno de consumo, na produção e geração de emprego e renda que, ampliaram a arrecadação do Estado. As políticas de transferência de renda, além de garantir dignidade para as pessoas que antes estavam em situação de pobreza extrema, aquecem a economia local, estimula o comércio, a indústria, os serviços. É bom para todos.
Há vários exemplos de experiências com renda básica em curso no mundo neste momento. São países ou regiões tão diversos e diferentes em termos econômicos, políticos e sociais: como Finlândia, Ontário (Canadá), Stockton (Califórnia), Barcelona, Quênia, Escócia, Utrecht (Holanda), Reino Unido, Itália e Índia já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica.
Em conjunto com especialistas das áreas das políticas sociais e orçamento, a bancada do Partido dos Trabalhadores na Câmara Municipal de Belo Horizonte apresenta um projeto viável de renda básica para a cidade. Assim como em todo o Brasil, Belo Horizonte sente os efeitos das crises econômica e sanitária: aumento expressivo em pessoas em situação de rua, de pobreza e extrema pobreza e da insegurança alimentar. Algumas distinções e esclarecimentos precisam ser feitos sobre o modelo de Renda Básica que defendemos.
A rigor, entende-se por renda básica uma transferência de renda monetária para cidadãos sem exigência de qualquer condicionalidade. Em alguns países europeus, no Canadá e mesmo nos EUA, existem projetos de renda básica que tem perfil universal.
O projeto que a bancada do PT-BH apresenta é diferente porque defendemos a concessão da renda básica que tenha como recorte a linha da pobreza e da extrema pobreza estabelecida pelo CADÚnico. O que fortalece o Sistema Único da Assistência Social – SUAS, e as diversas iniciativas instituídas ao longo das últimas quase três décadas, desde a aprovação da Lei Orgânica da Assistência Social, em 1993. Defendemos esse recorte também porque somos um país de renda média, o que inviabilizaria a adoção de uma política universal.
Por isso, nossa proposta de renda básica complementa, no âmbito local, o Programa Bolsa Família, e contribui para a redução dos índices de pobreza e extrema pobreza. Do ponto de vista econômico, acreditamos que nossa proposta de Renda Básica também exerça o mesmo efeito positivo sobre a economia local, já vistos na execução do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada, especialmente nas periferias e nos centros comerciais distantes do perímetro do hipercentro.
Queremos assim, com o debate e a implementação do Renda Básica, iniciar a produção de políticas públicas para combater a fome, a pobreza e a extrema pobreza neste momento pandêmico. Mas também preparar a Belo Horizonte que queremos agora e nos pós-pandemia: uma cidade inclusiva e digna para todos e todas.
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